CARTA PRO MEU PAI

Oi pai

Pois é.

Esta batalha não deu pra ganhar.

Mas, se existe algum consolo, é saber que esta é uma batalha que todos nós, mais dia, menos dia, iremos perder.

Mas, rapaz, perder dois dos meus heróis em tão pouco tempo foi difícil!!!

O herói das estrelas e da imaginação, eu não conheci.

O verdadeiro herói do dia-a-dia, esse eu conheci muito bem e vai fazer muuuuita falta.

Pai, seu humor caustico, politicamente incorreto, vai deixar saudades.

Assim como sua inteligência, cultura e rapidez de pensamento.

Nos últimos tempos, pai, você andava meio triste, com algumas dores. Pouca disposição.

Até pro sitio que você tanto gostava, sua “menina dos olhos”, você não queria mais ir.

Não conseguia ler ou ver TV.

Mas, teimoso, não quis saber de se cuidar, como nenhum de nós, homens, gostamos de nos cuidar.

Você vai fazer falta, pai.

Tem muita gente que dependia de você.

E tem muito mais gente que gostava de você.

Nós, filhos, mulher, netos, sobrinhos, irmãos e amigos estamos meio sem chão ainda.

Mas passa, como tudo nessa vidinha nossa.

Vamos esquecer isso.

Melhor lembrar da fase boa, do bom humor.

Vivemos juntos por 52 anos.

A segurança de saber que você estava por ali, meio quietão, mas a disposição, facilitou muito minha vida.

Era mais fácil arriscar, sabendo que tinha seu “backup” por trás, se precisasse.

De você, pai, herdei manias (boas), como a de não dar o passo maior que a perna.

E, principalmente, o orgulho de cumprir minhas obrigações em dia.

Não devo nada pra ninguém.

Não atraso meus processos.

Procuro dar a cada um o que é seu, como você sempre me ensinou.

Pai, não deu pra ficar do seu lado no velório.

Mas me despedi de você no hospital, com um beijo, meio desajeitado, na sua testa.

Ouvi a sua ultima piadinha pro enfermeiro, quando disse que um dos pedidos, feito no ano-novo, foi o de ser operado no Sírio.

O enfermeiro não entendeu nada, mas eu ri muito do seu cinismo.

Vamos tocar para frente, pai, porque não da pra ficar parado.

E vamos tentar levar com a gente, para sempre, o seu último conselho para a Célia, mas que vale para todos nós:  

“Juízo”.

´Brigado, pai.

Por tudo.

Grande beijo.